domingo, 3 de outubro de 2010

Corpos amputados e protetizados - Comentário 5- Livro: Corpos Mutantes

O texto de Luciana Laureano Paiva, Corpos amputados e protetizados: “naturalizando” novas formas de habitar o corpo na contemporaneidade, traz algumas inquietações, as quais moveram a autora a olhar mais atentamente para esses corpos, tidos como os “outros”, ou seja, os diferentes, os deficientes, os imperfeitos ou até mesmo chamados de anormais.

Diante de uma pluralidade de corpos amputados, ela optou por pesquisar, em uma clinica privada de Santa Catarina, corpos submetidos a amputações cirúrgicas com o intuito de resgatar a sua funcionalidade corporal e a reintegração social pelo uso de próteses funcionais.
Durante algumas de suas entrevistas, os pacientes revelaram que falar sobre seus corpos amputados era uma tarefa difícil, principalmente porque se tratava das suas imperfeições, era mais fácil falar do passado, do tempo em que seus corpos ainda eram “perfeitos”, “normais”. Numa sociedade que privilegia a eficiência e o dinamismo, perder uma perna significa também perder a normalidade e passar a ser visto como ineficiente.


Os indivíduos atribuem a partes do seu corpo uma carga parcial ou total de sua identidade. Desta forma, amputar uma perna pode significar a perda de uma referência, pois seu corpo “diferente” já não serve mais como parâmetro de igualdade.
O corpo amputado passa por um processo de reconfiguração, onde a peça desgastada, ou seja, o segmento que já não funciona adequadamente é extirpado por via cirúrgica e substituído por uma prótese.
Nosso corpo é nossa principal referência para construção da nossa identidade. A amputação ocasiona a morte real de uma parte do corpo do indivíduo, de um estilo de vida e de sua identidade. Porém, diante de uma situação limite como a amputação, mais do que nunca o imperativo é Fazer-Viver, mesmo que para isso o indivíduo abdique de uma parte de si, de um modo de vida para reviver numa outra “forma” corporal.
Após a amputação, tanto o individuo como o seu corpo tornam-se ao mesmo tempo desconcertantes e desconhecidos. “Quem sou eu agora?” um dos pacientes entrevistados chegou a revelar que nunca mais se olhou no espelho. O espelho pode ser pensado metaforicamente como a imagem do indivíduo que se reflete tanto no vidro espelhado, quanto no olhar do outro. Ambos passam a ser os mais cruéis julgadores de sua aparência incomum.

A aparência externa torna-se uma praga que potencializa exterminar em si, todo o tipo de desvio que a desalinhe física e moralmente.Todas as transformações ocorridas nos corpos dos indivíduos, tanto as perdas quanto os ganhos, as mortes e os renascimentos, não são processos solitários, mas compartilhados com todos aqueles que fazem parte de suas vidas privadas e sociais, conhecidos e desconhecidos, próximos e distantes. Por esta razão torna-se relevante refletir sobre os efeitos produzidos pelo olhar do outro sobre os corpos amputados.
Num mundo heterogêneo como o nosso, o encontro com o diferente é inevitável e um olhar menos perturbador pode causar menor impacto, permitindo que o indivíduo não se sinta tão desconfortável com a sua situação.

E as tecnologias, o que fazem por esses corpos amputados?

As máquinas estão cada vez mais presentes na vida das pessoas, acoplando-se aos seus corpos com próteses de toda a natureza. Dessa forma “o corpo tornou-se lugar privilegiado das técnicas e o destino certo das máquinas” (Couto, 2001 p.87)

Dotado de um caráter inacabado, as tecnologias invadiram o corpo humano porque o mesmo permitiu. É impossível falar de corpo sem mencionar as tecnologias. As tecnologias invadiram o território biológico, tanto externamente quanto internamente, as tecnologias foram assumindo múltiplas funções no nosso corpo. Os conhecimentos produzidos pela medicina sobre o copo humano e as evoluções biotecnológicas prepuseram algo ao corpo; extirpar os seus excesso, preservar a sua saúde, embelezá-lo, bem como aumentar o seu desempenho.
As máquinas estão cada vez mais presentes na vida das pessoas, acoplando-se aos seus corpos com próteses de toda a natureza.
Então as máquinas passam a ser artefatos protéticos, componentes íntimos e amigáveis de nós mesmos. As próteses passam a ocupar um lugar importante na vida dos indivíduos, deixando de ser um objeto estranho para assumirem a função de acessórios pessoais. Sua ausência pode começar a ser sentida por usuários como algo desagradável. Como relata um paciente:
"Quando eu tô com a prótese e tiro ela, eu sinto falta, sabe?!"
Então podemos concluir que “o hibridismo entre o corpo e a máquina não significa o fim do corpo, mas paradoxalmente, uma das formas excelentes de sua afirmação contemporânea. Portanto, há muito tempo o indivíduo deixou de ser visto como algo natural para se tornar algo naturalmente artificial, ou seja, ciborgue” (Couto , 2000; Haraway,2000)

Espetáculos entre cyborgs = luta Vale-tudo. Comentário 4- Livro: Corpos Mutantes

No texto de Silvia Goellner e Claudio Ricardo Nunes, “O espetáculo do Ringue: O esporte e a potencialização de eficientes corporais”, eles nos fazerem refletir sobre os corpos híbridos, potencializados, os corpos espetaculares que saltaram das revistas em quadrinhos, das telas de cinema e cartoons e que passaram a ocupar espaço nas academias, nos ringues, nos shopping-centers e nas ruas de nossas cidades.

O texto por eles produzido discute a potencialização e a espetacularização dos corpos produzidos pelo esporte e pela cultura física. Eles investigaram algumas academias de luta “vale-tudo” (Maxial Marcial Arts -MMA) em Porto Alegre e observam que em muitas situações a construção do corpo para a luta requer aditivantes químicos e atenuantes para as dores e lesões causadas durante a "preparação" para a luta e para a luta propriamente dita.

O corpo lutador ocupa as principais atenções de parte dos atletas, treinadores, preparadores físicos, juízes, patrocinadores e da assistência, porque é nele, no corpo que se apresenta no ringue, que estão concentrados vários investimentos. A preparação física-técnica-tática para a luta, que se dá nas rotinas de treinamento e que resulta na fabricação deste “corpo guerreiro”, também faz com que os atletas façam uso de suplementos alimentares e, na grande maioria dos casos, de anabolizantes.

O consumo dessas substâncias químicas objetiva intensificar o uso do corpo no sentido de lhe conferir maior energia e disposição para enfrentar horas diárias de treinamento.A ingestão dessas substâncias ocorrem no próprio local de treino, geralmente no final do mesmo. O uso desses produtos químicos está diretamente ligado ao aumento da força física, considerada no contexto das lutas, como um bem a ser constantemente prezado e cultivado, afinal, é através dela que a vitória, o capital simbólico, é conquistada. O uso de esteróides anabolizantes têm grande circulação dentro dos ambientes de luta e são conseguidos através de estratégias tão diversificadas quanto tornadas invisíveis. São medicamentos de uso controlado (os tarja-preta da linguagem popular), esses produtos vêm em versão nacional ou importada, de países como o Paraguai.

O copo malhado, sarado, forte, ágil, eficaz e, sobretudo, vitorioso, é a meta a ser atingida. É também um passaporte para o espetáculo dos ringues, pois seu sucesso está diretamente ligado a sua performance corporal e ao seu desempenho, é claro. Seu corpo é encarado como uma máquina de guerra, capaz de impor medo, respeito e admiração e, se possível, impor a derrota a um adversário.


Após ler este texto não há como deixar de questionar:
Estes "espetáculos" são lutas entre "seres humanos" que são treinados para lutar em um ringue ou "Cybors" programados para vencer?

sábado, 2 de outubro de 2010

Velhice ou terceira idade? - Comentário 3- Livro: Corpos Mutantes

O texto: Velhice, palavra quase proibida; Terceira Idade, expressão quase hegemônica, de Annamaria da Rocha J. Palacios nos faz refletir sobre o uso das expressões “velhice” ou “terceira idade”.

Seria a velhice uma época sombria, decrépita, repleta de temores da morte, de acompanhamento de doenças. A fase final da vida?


E a terceira idade apenas uma fase posterior a primeira e a segunda. Onde a primeira é a infância, a segunda a maturidade, e a terceira (ainda que aponte para o final da vida) não faz alusão a velhice e sim a uma próxima fase?

Annamaria mostra isso em sua pesquisa feita com anúncios publicitários de cosméticos e nas propagandas destinadas a este grupo de pessoas, principalmente em revistas femininas brasileiras na década de 90.

Nos enunciados de publicidade dos cosméticos, a partir dos anos 90, identifica-se um jogo de linguagens que determina que a velhice deve ser combatida, sabendo-se que a juventude pode ser conservada.
“combater a velhice é buscar recuperar a juventude, conservar a juventude é também combater a velhice” Annamaria Palacios

Assim, relata-se uma espécie de luta articulatória entre o vocábulo “velhice” e a expressão “terceira idade”. Um com suas conotações negativas e o outro liberto das mesmas.
Nesta luta articulatória de linguagens podemos afirmar que o fato de se chegar a velhice implica também em ter chegado a terceira idade. Então, ter chegado a terceira idade também implica em ter chegado a velhice?
De acordo com as campanhas publicitárias, somos induzidos a responder que não! Isto também seria politicamente incorreto. Chamar um indivíduo de velho provoca constrangimento entre o falante e o destinatário.
Falar “velhice” ou “terceira idade” ainda representa ambivalência semântica. A expressão terceira idade tende a tornar-se menos evidente pela familiaridade que o termo tende a adquirir. Ao mesmo tempo a palavra velhice cai em desuso, tende a sumir.
Então aqui fica o meu conselho:
Quando encontrar uma pessoa acima dos 60/65 anos de idade, cuidado com a expressão que irá usar. Você poderá estar ofendendo o mesmo se usar a expressão inadequada.

Refletindo sobre os percursos do corpo padrão exigido na nossa cultura - Comentário 2- Livro: Corpos Mutantes

Existe um padrão físico-corporal? O que os meios de comunicação de massa nos propõem como corpo padrão de beleza é sinônimo de saúde e bem-estar? O corpo canônico (o corpo desejável nos meios de comunicação em massa) é o corpo “ideal”? Estes são alguns dos questionamentos que a autora do artigo “os percursos do corpo na cultura contemporânea”, Malu Fontes, faz ao leitor e que nos deixa a refletir sobre o culto a chamada “boa forma” física.


A autora deste artigo ressalta que os padrões do corpo vão mudando com o tempo, que existe uma história para a mudança dos mesmos, o corpo perfeito de hoje já não é mais o mesmo de alguns anos atrás. Como exemplo, temos o corpo da mulher brasileira que, em termos de apelo sexual, na década de 80 era quadris largos e cintura fina, hoje são seios grandes (à custa de implantes de próteses de silicone).

O fenômeno do culto ao corpo parte do estágio em que o corpo era demonizado (escondido ou fonte de vergonha e pecado) e culmina com a explosão dos músculos (dos corpos trabalhados em academias), ou seja, um corpo potencializado em aspectos estéticos.



As cirurgias estéticas vêm logo em seguida. Os implantes e a profusão das técnicas médicas, químicas, cosméticas e de vestuário dão um grau ainda maior de idolatria à forma física do corpo potencializado, objeto tão valorizado pela mídia de massa.
Para fugir da mais leve associação com a monstruosidade seja via obesidade ou velhice, recorre-se cada vez mais a sofisticados e eficientes processos visando à construção do corpo canônico.


O jogging está sendo substituído pelo bisturi! Os resultados antes obtidos apenas com a freqüência à academia de ginásticas parecem não mais atender às necessidades de mudanças imediatas que se deseja para a remoldagem do corpo. Triunfa o papel da medicina e dos cirurgiões plásticos. Não há mais por que esperar se o resultado pode ser mais adequado e mais imediato pelas vias tecnológicas. A busca do corpo esculpido (das curvas definidas e dos seios volumosos no corpo feminino) pode ser alcançado por aqueles que podem pagar pela reengenharia, pela própria estrutura corporal.
“O brasileiro é, entre os povos do mundo, em uma perspectiva percapta, aquele que mais realiza realiza cirurgias plásticas estéticas”.
Fica aqui o meu questionamento:
Daqui para frente, o que nossos corpos serão submetidos para seguir as normas de corpo canônico, do padrão ditados pela mídia de massa?

Tecnologias a favor do ser humano - Comentário 1- Livro: Corpos Mutantes

Como podemos observar no texto de Homero Luís Alves de Lima, Corpo cyborg e o dispositivo das novas tecnologias, que os avanços tecnológicos estão impulsionando cada vez mais a correção de certas “imperfeições” (se as mesmas existirem) em corpos humanos.
Corações, tecidos, rins, fígados, todos artificiais, já estão sendo testados e fabricados pela bioengenharia em seres humanos. Pois, como se sabe, já é possível construir vida em laboratório. O DNA de um determinado ser humano já pode ser decifrado, ou melhor, digitalizado. Corpos e máquinas que antes pareciam separados agora estão se misturando. Estamos na era da “mecanização do humano” ou seria melhor dizer da “vitalização das máquinas”?
A tecnologia invade o biológico e a recíproca também é verdadeira: a biologia invade o mundo das máquinas. Hoje, não está claro onde termina o humano e começa a máquina ou onde termina a máquina e começa o humano.
Então o que somos nós: Humanos ou máquinas? Ou a mistura dos dois: cyborgs – o “humano-tecnológico”?
Não há nada de assustador nisso. Atualmente, há muitos ciborgues em nossa sociedade. Não se referindo apenas aos robocops, mas sim a qualquer pessoa com um órgão artificial ou uma prótese implantada ou até mesmo usando um aparelho de marcapasso.
Observe as imagens abaixo:

Então, como questiona Haraway, "Por que nossos corpos devem terminar na pele?"